Jornalivro

30-11-2010 09:51

 

Jornalivro

 

 

Capítulo 1

 

O Vendedor de Balas

 

- Quero ser feliz como o Evandro Mesquita!

Essas foram as palavras de Pedro em seu leito de morte, embaixo de uma mangueira cheia de frutas. Ao seu redor estavam os verdadeiros amigos: Gandhi, um cachorro vira-lata marrom e Sr. Luiz, um mendigo desdentado, que, por esquecimento, demorava a responder qual era o próprio nome, pois na sua vida insólita de andarilho poucos queriam saber. Pedro acabara de conhecer Sr. Luiz e considerava seu melhor amigo. Ferido no peito, nosso herói fechou os olhos e iniciou sua jornada mais longa. O caminho estava em sua mente...

Viajando em sua memória ele volta ao dia 13 de agosto de 1981, na Favela da Rocinha, Rio de Janeiro. Às 16 horas, o pequeno garoto de 7 anos, moreno e cabelo liso queimado pelo sol, se aproximava de sua casa. Havia vendido todas as balas e chicletes, queria levar uma boa notícia à mãe, dona Ana, faxineira e viúva, que sonhava ver o filho doutor, médico, advogado, engenheiro, enfim qualquer formação que chamassem de doutor, assim como os seus patrões.

Pedro não tinha irmãos e seu pai, o sapateiro Edgar, sempre cantarolando músicas americanas, com letras de um inglês inventado, já que era analfabeto, e escutando o jogo do Fluminense no rádio colado ao ouvido, não percebeu a aproximação de um ônibus e morreu atropelado no dia 20 de junho de 1974, dia que Pedro comemoraria seu primeiro ano de vida, por isso nunca teve uma festa de aniversário.

Pedro sobe ladeiras, escadas e vielas estreitas até para uma criança. Em frente ao seu pequeno barraco de quarto, cozinha e banheiro, uma movimentação de vizinhos chamava a atenção. Assustado o garoto perguntou o que estava acontecendo. Dona Carminha, uma das vizinhas, que assim como os pais de Pedro nasceu no estado do Ceará, com lágrimas nos olhos, respondeu:

- Calma Pepê! Você vai ficar um tempo lá em casa.

Sem entender nada, o pequeno vendedor de balas entrou em casa. Márcio, um jovem estudante de enfermagem e o sr. Chico que vendia remédios no seu bar-mercadinho, explicava ao policial que dona Ana foi comprar leite e começou a passar mal. Sr. Chico chamou o Márcio, levaram a senhora pra casa, mas não resistiu. O coração da bondosa dona Ana parou. Pedro, antes que escorresse a primeira lágrima perguntou:

- Ela falou alguma coisa pra mim. Disse o que era pra eu fazer?

Dona Carminha percebendo que a criança estava perdida, sem saber o que fazer e sendo conhecedora do sonho da amiga em ver o filho se tornar um doutor, deixou escapar da sua boca a mentira mais linda que já se ouviu:

- Pepê, ela disse que tava indo para um lugar muito bonito e que você não poderia ir agora, porque lá estão precisando de um doutor e você precisa ficar aqui e estudar. Se tornar um doutor pra depois ir também. Ela falou também que você ficasse na minha casa.

Todos confirmaram as palavras de dona Carminha, pois sabiam do sonho de dona Ana e que ela não tinha mais contato com seus familiares no nordeste, pois havia fugido para casar com o sr. Edgar. Acompanhado pelo olhar dos presentes, o pequeno vendedor de balas beijou a mão da mãe, lentamente saiu de casa, olhou para o céu e só então chorou.

 

Continua...

 

 

 

 

 

Ernesto Ribeiro Bezerra